7.12.12
Diário de um Voluntário
11 de Janeiro de 1865, Porto Alegre, Rio Grande do Sul
Droga e dupla droga. Eu não consegui escrever ontem no meu diário, e já arruinei, do principio, a ideia de eu fazer anotações aqui todos os dias. Me desculpo. Mas vou explicar o que aconteceu hoje e ontem, para "compensar" essa terrível perda:
(10 de Janeiro) Logo que acordei, fui para o quartel local, que se encontrava a umas boas léguas da minha casa, então só cheguei la quando ja era quase meio-dia. Incrivelmente, eu nao havia chegado atrasado, por que no primeiro dia o treinamento só sairia de tarde, então eu tinha alguns minutos, ou ate algumas horas para ficar por ali, descansado e refletindo. Eventualmente, eu vi o oficial do regimento começar a fazer a chamada dos inscritos, e como meu nome e Andre, logo já fui para o campo de treinamento, que era basicamente um campo que terminava em mato. Sentando-se no chão um a um, em um grande circulo, o regimento foi se amontoando, e eventualmente o ultimo respondeu a chamada. Acredite ou não, existe um pobre bastardo no mundo chamado Zdzislaw. Obviamente, ele e um imigrante polonês Eu notei, só olhando para a cara de meus colegas, que esse regimento era quase uma Legião Estrangeira, de tao diversificada que era. Escravos e imigrantes, assim como nativos e mestiços todos juntos pela Guerra. Enquanto eu filosofava mentalmente sobre como a guerra unia as pessoas, o sargento soltou um grito, e pediu para que todos se alinhassem em uma fileira em posição de sentido.
A linha, incrivelmente, não chegou a cruzar todo o campo, apesar de constarem 500 voluntários lado a lado. Eu me perguntava se meus irmãos estavam treinando naquele momento. Então, ele começou a falar.
"Bom, vocês a partir de agora, são Voluntários da Pátria em guerra, ou seja, soldados do imperador Dom Pedro II. Espero que se sintam honrados, por que vocês não passarão por muitos momentos felizes uma vez que comecemos a marchar para o Paraguai ou para derrotar as forcas invasoras. Eu só vou dizer-lhes uma coisa: O Paraguai, de acordo com nossos espiões, pretende atacar essa província, então vocês podem ser uns dos primeiros voluntários a morrer. Se eu fosse vocês estaria soltando lagrimas de orgulho."
Antes que alguém pudesse fazer algo, ele continuou:
"Eu sou encarregado de manter a disciplina e de dar as ordens a vocês, vocês poderiam me dizer o que vocês são agora?"
Eu fiquei confuso com a pergunta, e nada disse. Alias, ninguém falou nada.
"Vejo que temos um longo caminho pela frente."
Depois disso, ele começou a pedir que executássemos vários exercícios básicos, como por exemplo fazer polichinelos e flexões. Eu comecei a ofegar na metade deles, e pelo fim, eu estava completamente exausto. O sargento, que fez os exercícios conosco, ou era muito bom em esconder cansaço ou era a pessoa mais resistente que eu conhecia. Ele mal soou depois de fazer horas e horas dos exercícios mais
puxados conhecidos pelo Homem... Eu começo a achar que não nasci para ser soldado.
Ele então nos disse que aquele local onde eles estavam era um quartel, e que seriamos organizados em quintetos, e iriamos para quartos. Ele disse, então que era para nos acostumarmos com nossos colegas de quarto e irmos nos conhecendo melhor, por que a partir dali eles seriam nossos colegas ate o fim, sendo o fim a morte ou o fim da guerra. Sinceramente, eu espero que seja a segunda opção. Não quero
carregar as coisas de quatro mortos, nem quero virar peso morto (literalmente). Acontece, então um sorteio. Basicamente, cada um pegaria um papel, e cada papel teria um numero. Haviam 5 papeis com o mesmo numero, para cada numero de 1 a 100, logo, formando os 5 quintetos do regimento. Eu, com minha grande sorte, consegui o numero 13.
Eu então esperei, e esperei, e só la pelos últimos voluntários e que foram sorteados meus colegas de quarto, ou melhor, de exercito. O primeiro deles era Ulisses da Souza. Ele e um brasileiro, mestiço e e bem magro, e não e bom conversador, pois e tímido. Então, foram sorteados Hugo Guimarães e Franz Nulle. O primeiro também e brasileiro, porem ele e filho de uma escrava com um dono de engenho, e quer usar a guerra como forma de conseguir a liberdade. Admiro isso. Agora, Franz e a pessoa mais rude e arrogante que já vi, sem falar que ele não olha Hugo nos olhos. E bem alemão cabelos loiros e um bigode malcuidado, ate. Pessoa mais branquela que já vi, ele e quase que o exato contrario do seu colega Hugo, tanto em aparência quanto personalidade. Um e gentil, e humilde, e o outro, arrogante e rude. Vejo que eles não vão se entender muito bem, já que imigrantes não tem um histórico de serem gentis com escravos e nativos.
Eu estranhei que não havia um quinto integrante, mas, olhando para o sorteio, havia uma ultima alma solitária que usava o ainda mais deprimente nome de Eduardo Kill. Eu sabia um pouco de inglês pois aprendi com meu pai, e sabia que "kill" era "matar", em inglês. Porem, mesmo com esse nome, Eduardo e uma pessoa radiante, e otimista. Ele aparenta ser meio cínico pois chegou a fazer piadas sobre tragedias, como "Bom, se a gente morrer numa batalha, vamos morrer já arrumados pro enterro". Eu tinha, no inicio, dificuldade para rir dessas piadas, mas depois eu comecei a gargalhar com elas. Talvez eu comecei a perder o medo da morte.
(11 de Janeiro) Eu não pude pegar minhas coisas em casa, isso seria feito no dia seguinte, e fui obrigado a passar a noite no quartel, então não pude escrever nada. Bom, mas tudo bem, isso basicamente contou como um capitulo do dia 10, já que hoje, dia 11, os treinamentos foram interrompidos por uma mensagem urgente para nosso sargento, então ficamos vadiando pela cidade pelo resto da tarde, e também fomos pegar nossas coisas em casa. Minha mãe ficou sensibilizada com tudo aquilo, então ela nem foi me dar adeus. Meu pai, porem, me abracou e apenas disse para eu não confiar nos judeus, que eles iriam me tapear nos jogos de cartas. Então ele me perguntou por onde andavam meus irmãos. Eu disse que não sabia, pois ficamos em regimentos diferentes. Eu perguntei, então se ele havia visto eles, mas ele disse que eles não haviam ido pegar as coisas deles ainda. Estranhei.
Porem, enquanto eu saia de casa, fui saudado por Roberto, o cacula. Ele me perguntou como iam as coisas, e eu disse que os treinamentos eram puxados. Perguntei que fim deu ele, mas ele só disse que ele fora posto na reserva, para a marinha, e que como ia demorar para a marinha se mexer, ele iria ficar na reserva ate ser chamado, portanto, em casa, vadiando e fazendo nada de bom. Eu confesso que senti um pouquinho de inveja dele.
Agora estou aqui, em meu quarto, escrevendo isso na minha cama (a unica de solteiro, as outras quatro são de beliche. Ganhei o sorteio), enquanto Hugo, Ulisses e Eduardo jogam truco, e Franz lé um livro. O nome dele e "Manifesto Comunista". Eu já perguntei pra ele sobre o que se trata, mas ele só disse que nem ele sabia, e era por isso que ele estava lendo o livro. Achei interessante a palavra "comunista". Eu me pergunto o que que ela poderia significar.
Bom, agora eu vou terminar por aqui, e vou ali desafiar meus colegas no truco.
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